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sexta-feira, 4 de abril de 2025

Portugal paga para eles mandarem foder o português.


 Aposto que poucos portugueses sabem disto. Mas calma, não precisam de me chamar teórico da conspiração – para evitar confusões, incluo as fontes directas. Assim, qualquer pardal que apareça com conversa fiada tem onde ir confirmar.  Ora bem, Portugal comprometeu-se a despejar 95 milhões de euros em Cabo Verde ao longo do Programa Estratégico de Cooperação (PEC) 2022-2026. O pacote cobre setores como educação, saúde, segurança, economia e infraestruturas conforme link que se segue. [oai_citation:1,Portugal e Cabo Verde assinam novo plano de cooperação até 2026](https://culturaportugal.gov.pt/pt/saber/2022/03/portugal-e-cabo-verde-assinam-novo-plano-de-cooperacao-ate-2026/). Muito bonito no papel. Mas na prática, parece que o dinheiro tem sido usado para empurrar o “crioulo” para dentro das escolas e mandar o português borda fora. Sim, aquele mesmo português que abriu a Cabo Verde as portas do mundo e que continua a ser a língua oficial do país.  Claro que isto não é novidade. Há anos que certos círculos tentam empurrar a ideia de que o português é um corpo estranho em Cabo Verde e que a verdadeira identidade do arquipélago passa pelo crioulo. Mas agora a questão é outra: quem é que está a pagar esta transição? Ora, ao que parece, somos nós.  

Portugal, sempre magnânimo, ainda perdoou 12 milhões de euros da dívida cabo-verdiana, convertendo o valor num fundo para a “transição climática” conforme o link que se segue [oai_citation:2,Portugal apoia transição ambiental e energética de Cabo Verde - XXIII Governo - República Portuguesa](https://www.portugal.gov.pt/pt/gc23/comunicacao/noticia?i=portugal-apoia-transicao-ambiental-e-energetica-de-cabo-verde). Se Cabo Verde depois decide investir essa folga orçamental na promoção do crioulo e na desvalorização do português, problema deles – mas pago com o nosso dinheiro. E há mais: em 2022, Portugal ainda transferiu 580 mil euros de apoio humanitário, mais 500 mil euros de reforço ao Orçamento do Estado cabo-verdiano [oai_citation:3,Governo português disponibiliza mais de 580 mil euros em apoio humanitário para Cabo Verde - XXIII Governo - República Portuguesa](https://www.portugal.gov.pt/pt/gc23/comunicacao/noticia?i=governo-portugues-disponibiliza-mais-de-580-mil-euros-em-apoio-humanitario-para-cabo-verde).  

Agora, aqui entra a ironia: Portugal despeja dinheiro em Cabo Verde e, em troca, recebe um grande pontapé na língua portuguesa. Os miúdos aprendem crioulo na escola, mas quando querem prosseguir estudos vêm para Portugal, onde entram nas faculdades sem exames ou testes de admissão. Chegam cá e… surpresa! Não sabem falar português, não sabem escrever português, e não entendem nada de nada. Mas passam, porque ninguém quer tocar no vespeiro da “cooperação” e da “inclusão”. Depois regressam ao arquipélago para continuar a mesma política: promover o crioulo para os filhos dos pobres.  É caso para perguntar: Portugal está a financiar a cooperação ou a própria irrelevância da sua língua num dos seus parceiros históricos? No fundo, Cabo Verde faz o que quer – e Portugal paga.


Adérito Barbosa in olhosemlente.blogspot.com

A mesma vida noutro tempo.

“Tenho saudades dos tempos em que, no Liceu, havia os burros, os gordos, os caixas de óculos, os sonsinhos, os pretos, os chineses, o indiano, o artolas, os maricas e os lingrinhas. Os burros chumbavam, não se tornavam doutores como hoje em dia. A fasquia era definida pelo marrão da turma, não era nivelada por baixo, como agora, com essa merda de que somos todos iguais – diz-se.  Antes, não parecia que fôssemos iguais. O gordo também tinha notas brutais e ninguém sabia como; talvez porque o gajo não jogava à bola. O caixa de óculos tinha um sentido de humor inigualável, mas não fazia corridas – o gajo tinha medo de cair. O preto jogava à bola como ninguém e fazia umas fintas dos diabos; tinha um cabedal do caraças, fora do comum. O chinês tinha vindo de outra escola, sabia à brava inglês e tinha histórias que não lembrava a ninguém.  Cada um tinha um defeito – eu, por exemplo, era conhecido por "crioula". Sempre que chamavam "crioula", havia batatada. Não gostava de ser comparado às bonitonas crioulas. Lutei até que se esqueceram dessa alcunha. Ter uma alcunha diferente era fixe. A diferença era vista com bons olhos. Agora, tudo ou é bullying, ou racismo, ou xenofobia, ou opressão, ou assédio, ou violência.  

Antigamente, quando se era mesmo racista, levava-se um chapadão na tromba e aprendia-se logo que o preto era como os outros – apenas tinha cor diferente. E não era bullying. Era viver e aprender. Era duro. Às vezes, em casa também se aprendia à chapada.  O menino insosso passava despercebido e sentia-se sozinho. E aprendíamos uma coisa importante: a rir-nos de nós próprios – não a chorar porque alguém nos chamou nomes. Assumia-se a gordura, o esquelético, o caixa de óculos e tudo o mais que nos chamassem. Mas quando não se estava bem, quando não se gostava da alcunha, fazia-se uma coisa importante: mudava-se, lutava-se por acabar com ela. Não se culpavam os outros nem a sociedade. Não se faziam queixinhas. E falhava-se. Muitas vezes. E, cada vez que falhávamos, ficávamos mais fortes. E sabíamos que era assim. Que havia uns que conseguiam, outros que ficavam para trás. Que havia quem vencia e quem falhava.  Agora, não… Todos somos iguais. Há mesmo a chamada igualdade de género. Todos somos bons, todos merecemos, todos temos as mesmas oportunidades, todos devemos até ganhar o mesmo, todos somos vítimas, todos somos oprimidos… e todos somos parvos. Porque aceitamos este ambiente do politicamente correto sem dizer nada. E até devemos dizer que somos "normais". Segundo o novo paradigma social, devem ter muito cuidado comigo, porque:  

– Sou velho, tenho mais de 65 anos, o que faz de mim um tolo improdutivo que gasta estupidamente os recursos do Estado.  

– Nasci mulato, o que me tornou um coitado, vítima das merdas dos brancos, dos pretos e dos amarelos.  

– Não voto na esquerda radical, o que me torna fascista.  

– Sou hétero, o que me torna um homofóbico.  

– Possuo casa própria, o que me tornou um proprietário rico e, agora, um latifundiário.  

– Adoto “foie gras” carne de caça, peixe do mar e cordeiro de leite, o que me torna um abusador de animais.  

– Sou cristão não praticante, sou um infiel aos olhos de milhões de muçulmanos.  

– Não concordo com tudo o que o Governo faz, o que me torna um reacionário, e até acham que me devo calar.  

– Gosto de ver mulheres bonitas, bem vestidas (ou despidas), ou superdecotadas, o que me torna um tipo capaz de assediar.  

– Valorizo a minha identidade portuguesa e a minha cultura europeia e ocidental, o que me torna um xenófobo.  

– Gostaria de viver em segurança e ver os infratores na prisão, o que me torna um desrespeitador dos direitos fundamentais protegidos.  

– O meu carro é a diesel, o que me torna um poluidor, responsável pelo aumento de CO₂.  Apesar de todos estes defeitos, acho que ainda sou feliz… Era mais, antes da pandemia. Aquela cena das vacinas lixou-me completamente a imunidade. Agora sofro com uma coisa que os entendidos chamam doença autoimune.  

Todos os dias engulo uns comprimidos e a vida segue, sem as modernices do politicamente correto.”


olhosemlente.blogspot.com

quinta-feira, 27 de março de 2025

Alguém que ponha a mão naquilo depressa

 


José Rodrigues dos Santos demonstrou ser um jornaleiro, incapaz de exercer a sua profissão com imparcialidade e respeito pelo entrevistado, independentemente das suas posições políticas. No entanto, a sua conduta na entrevista ao secretário-geral do PCP demonstrou ser a de um crápula que desvirtuou a essência do jornalismo sério e isento.  

A forma como conduziu a entrevista, revelando-se alguém que procurava descredibilizar o entrevistado, mostrou um profundo desrespeito pelo dever de informar com honestidade. O asqueroso jornaleiro fez da RTP um palco de confronto pessoal e um instrumento de manipulação política. Esqueceu-se de que nós, o público, já não somos totós, mas sim capazes de formar a nossa própria opinião com base em factos e não em distorções ou insinuações.  

Quando um jornalista se torna protagonista da entrevista e busca embaraçar o entrevistado em vez de esclarecer o público, compromete gravemente a sua credibilidade e a profissão que representa. O serviço público de informação merece mais do que espetáculos tendenciosos disfarçados de jornalismo. Como contribuinte da TV estatal, repudio tais práticas e exijo que alguém ponha mão naquilo, devolvendo à RTP o comprometimento com a ética e a responsabilidade.

Adérito Barbosa in olhosemlente.blogspot.com

sábado, 22 de março de 2025

O Silêncio cúmplice



O país está como está porque temos medo de falar medo de opinar, medo do desconforto que vem com a discordância. Temos medo das represálias, já não vivemos num regime onde uma palavra nos pode tramar, mas há outro medo, mais rasteiro: o de sermos olhados de lado pelos amigos, no café, no Facebook, e passarmos por chatos quando trazemos política para a conversa.  

Deixamos essa coisa da política para os políticos, e eles, espertos, tomaram conta do assunto. Fizeram-nos acreditar que política é um bicho perigoso, que só traz chatices. E, enquanto isso, foram levando a Europa para a guerra, vendendo a narrativa de que os russos são os maus, os palestinianos os bons e os israelitas os vilões. No meio do barulho, os militares, que antigamente se mantinham discretos, descobriram a reforma dourada dos debates políticos. Agora as televisões parecem um sanatório de generais. Só que eles não estão sozinhos. Os jornalistas também ajudam. Criam um facto, noticiam esse facto, lançam o alerta, debatem o facto, comentam o facto, recomendam o facto – e no fim fizeram de nós estúpidos.  

Sempre ouvi dizer, desde pequeno, que há três coisas que não se discutem: futebol, religião e política. Mas o futebol discute-se todos os dias, com paixão e sabedoria. Fala-se dos penáltis mal marcados, dos treinadores incompetentes, dos jogadores do SLB que não valem nada mas são vendidos a preço de ouro. A religião, essa, já ninguém quer saber – as igrejas só servem para sacar dinheiro aos crentes a troco de milagres que nunca chegam.  

Mas a política? Essa está de quarentena. É um tabu.  

Eu já fiz esse teste várias vezes: já escrevi sobre o governo, sobre a justiça, sobre os esquemas de sempre. Nada. Um deserto. Ninguém gosta, ninguém comenta. Mas o sistema de análises do blogue não mente: as pessoas passam por lá às centenas, às vezes aos milhares, espreitam, leem e saem de mansinho, como quem não quer ser visto num lugar suspeito ou em má companhia. Como se um simples ato de se manifestar fosse um risco.  

E isso dá um jeito danado a quem manda. Enquanto tivermos medo de falar, eles podem fazer o que quiserem. Podem mentir-nos na cara, que ninguém os desmente. Podem encher os bolsos à nossa custa, que ninguém protesta. Podem vender o país aos bocados, que ninguém quer saber.  

Talvez seja esse o maior truque da política portuguesa: fizeram-nos acreditar que a política é feia, suja, inútil. Que só os fanáticos e os interesseiros falam dela. O cidadão comum, esse deve manter-se calado, discreto, neutro – como se a neutralidade fosse uma virtude e não uma rendição.  Eles são os intocáveis. 

Do José Sócrates todos falam porque o tipo já está no chão. - Um dia, num parque de estacionamento na Ericeira, garantiu-me pessoalmente que é vítima de uma cabala.

E do Manuel Pinho? E do Costa que passou de bandido português a chefe da Europa. E do Luís Montenegro, que chegou a primeiro-ministro sem que ninguém desse grande conta, a não ser os amigos do costume, que o aplaudem porque o jogo do poder tem sempre os mesmos jogadores. Não foi eleito, não teve votos que lhe permitissem governar, mas lá esteve, sentado na cadeira de chefe. A gerir o país sem grande entusiasmo, sem sobressaltos, a exibir o seu ar de sobranceria e vaidade, enquanto recebia mensalmente uns trocos de uma casa de apostas.  

E do Restelo, as velhas gritam: "O procurador-geral da República é da cor dele, e não há razões para abrir inquérito e mencionar o nome do Luís!" 

Falar das gémeas que vieram de fora para um tratamento de milhões pago pelo Estado? Nem pensar. Enquanto isso, eu próprio estou há quase um ano à espera que o HFAR me chame para uma colonoscopia e uma endoscopia. No privado já me tratei medicado, curado e despachado. Do HFAR, ainda nada. Mas, para as gémeas, o estado tratou do assunto com uma eficiência que nenhum português sabia que existia. Quem ousou questionar o privilégio foi logo chamado de insensível e xenófobo.  

Tal como lembrar as grávidas do Bloco de Esquerda, e das causas dos gays. Afinal há por lá lésbicas. Assim faz sentido tanta luta.

E depois há as barragens da EDP, essas maravilhas de engenharia que deviam render milhões ao país. Foram entregues de bandeja, sem pagar um cêntimo de imposto. Venderam-se concessões, fizeram-se negócios obscuros no fim, a conta foi parar às mãos da malta consumidora. Os mesmos do costume que, todos os meses, recebe faturas de eletricidade cheias de taxas, contribuições e ajustes tarifários que ninguém entende.  

E os tribunais? Ah, os tribunais. Onde devíamos confiar, mas onde só se joga a política do costume. Eu assisti a uma entrevista do Juiz Carlos Alexandre, famoso e titulado de "super", por combinar com os procuradores qual será o próximo alvo, e disse que o que ganha não chega, por isso faz muitas horas extras a caçar. O juiz fez justiça espetáculo, com a ventoinha da CMTV na máxima velocidade a espalhar esterco e as suas sucursais – TVI, SIC , CNN e Now – a seguirem-lhe o rasto

No meio disto tudo, os verdadeiros culpados escapam sempre. Há sempre um erro processual, uma doença, uma prescrição, uma morte, uma testemunha que se engana, uma perícia que desaparece. E o sistema segue como sempre foi: com os poderosos a rirem-se da nossa impotência e o povo a pagar sem reclamar porque o pessoal tem medo.

E o que faz o Zé? O Zé está calado. Porque falar de política é feio e dá trabalho. Porque nos ensinaram que é perigoso, que é melhor não meter o nariz onde não somos chamados.  

O Zé só sabe pagar impostos sem perguntar onde vão parar. O Zé espera meses por uma consulta no hospital, enquanto vê os amigos do sistema passarem à frente. O Zé vota de vez em quando, mas sem grande esperança, porque já percebeu que muda o nome, muda a cara, mas o esquema é sempre o mesmo e ventoinha continua no máximo, a espalhar esterco contra os nossos olhos.


E assim seguimos limpando os olhos, a pagar, a ver e a calar. Como bons portugueses.


Adérito Barbosa in olhosemlente.blogspot.com

sexta-feira, 7 de março de 2025

O anónimo




Não tenho pressa; não quero envelhecer antes do tempo. Quero seguir meu caminho, enfrentando os dias abraçado às cordas das minhas guitarras, fingindo ser um roqueiro. E quando eu me for, que alguém diga: aqui jaz quem sonhou ser alguém na música e partiu como mais um anónimo.


Adérito Barbosa in olhosemlente.blogspot.com

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Crónica X II - dedicado aos Vendilhões do Templo, Bombarral 28Fev25





Venderam-me uma ilusão. Disseram-me que vivia numa sociedade igualitária, onde a justiça era para todos, a política servia o bem comum e o jornalismo informava. Garantiram-me que os médicos cuidavam da saúde dos doentes, a polícia protegia os cidadãos, os professores ensinavam, os prados eram verdes e as galinhas esgravatavam a terra como sempre fizeram. Que os militares viviam nos quartéis.  

Agora, olho à minha volta e vejo uma farsa. A política tornou-se um teatro do absurdo, onde governar é um jogo de bastidores e influências, e não uma missão de serviço público. Ser competente é um defeito, ter experiência de vida é um obstáculo. Se trabalhei, se construí algo, se me envolvi na realidade, então sou suspeito. Só aqueles que nunca fizeram nada na vida têm currículo para mandar. Se tive um café onde servia uns copos a um grupo de jogadores de cartas, já não posso ser ministro do vinho. Se tive galinhas no quintal e vendi ovos ao vizinho, então não posso tutelar a pasta da Agricultura. Os governantes são escolhidos como se a experiência fosse um crime.  
E enquanto essa gente nos distrai com casos e casinhos, esquecem-se de falar dos advogados das grandes sociedades que se sentam no Parlamento a cozinhar leis ao gosto dos amigos. Esses, ninguém questiona.  
Quanto ao jornalismo, já não há. Há jornaleiros, fabricantes de factos e mercadores de polémicas — ou melhor, vendilhões do templo. Passam o tempo a construir narrativas, a inventar escândalos, a decidir quem será crucificado no dia seguinte. Não informam, moldam. Não investigam, insinuam. Não questionam, impõem. Criam factos, comentam os factos que criaram e vendem-nos como se fossem a verdade revelada. E assim se vive, num ciclo vicioso onde a notícia de ontem já não interessa, porque hoje há uma nova indignação artificial para vender. É a perpetuação do jornalixo.  
Por sua vez, os professores, que em princípio eram para ensinar, acabaram por criar uma superclasse: a dos diretores escolares, com presidente e tudo. Viraram gestores eternos de escolas e passam o tempo a fazer política.  

Na semana passada, congratularam-se com o Governo por ter despejado milhões em computadores para as escolas por causa das provas intermédias. Enquanto há países europeus a bani-los das salas de aula, cá celebra-se o dia do descarregamento dos computadores. Claro que ninguém se lembrou de arrancar a ardósia das paredes. Os quadros velhos continuam lá, ao lado dos quadros eletrónicos novinhos, como um símbolo perfeito da contradição em que vivemos: vendem-nos modernidade, mas mantêm o peso do passado. Com estas mordomias, qualquer dia os professores deixam de saber escrever. Dos alunos, nem vale a pena falar.  
E no meio disto tudo, lá aparece Filinto Lima, sempre pronto para discursar. No outro dia, na Antena 1, discutia-se um estudo liderado pelo professor David Justino sobre a escola e a educação. No meio do estudo, concluiu-se que há um número significativo de turmas com quinze alunos ou menos. Aquilo foi fogo no rabo do Filinto — o tipo apareceu indignado com o resultado do estudo, com aquela conversa paternalista em nome dos alunos, que sinceramente já me cansa. A certa altura, um professor humilde entrou em antena e disse o que toda a gente pensa: que os diretores, incluindo o Filinto, estão agarrados ao lugar, que não largam o osso, e que já não fazem falta. Os senhores diretores, figuras ultrapassadas e longe da realidade, querem é eternidade nos cargos, a preparar o futuro dos jovens. Um absurdo, disse ele.  
“Mas que futuro? Um futuro em que os professores passam mais tempo a preencher grelhas e relatórios do que a ensinar? Em que os diretores são figuras vitalícias e aparecem na televisão sempre que um aluno se constipa?”

E o país segue ao ritmo dos comentadeiros: os militares passaram a políticos, de tal forma que parecem galinholas com grafonolas na mão, a berrar de manhã à noite, armados em especialistas de assuntos que desconhecem. O gado ainda pasta, as galinhas ainda esgravatam, os rios ainda correm para o mar e o preço de uma garrafa de água já custa tanto como um litro de gasolina. Tudo aquilo que me venderam como certo está a ir pelo cano, e eu pergunto-me se não fui eu que sonhei demais.  
Imagino um país onde a política é um serviço e não um trampolim, onde os jornalistas voltam a ser jornalistas e não fabricantes de polémicas, onde os diretores escolares largam o osso e deixam de aparecer na televisão ao mínimo espirro. Um país onde pensar ainda é permitido, onde o mérito conta, onde a experiência de vida não é um defeito e onde ser rico não é pecado.  
Um país onde a democracia cumpra o que prometeu.  
E, já agora, um país onde alguém me consiga explicar a história da Solverde e do Primeiro-Ministro Montenegro.  

Adérito Barbosa in olhosrmlente.blogspot.com

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

A Bandeira do José



José Neves, eu sei quem ele é. Conheço-o desde criança. Andámos na mesma sala, aprendemos a cartilha juntos e, no entanto, quase 60 anos depois, eu já me estou a familiarizar com o esquecimento das coisas, e o José ainda não aprendeu nada.  Agora quer oficializar o crioulo. Um sonho inocente? Nem pensar. No fundo, ele já traçou o seu grande desígnio: acabar a carreira política em Santa Catarina, talvez como presidente da Junta de Freguesia do Cutelo – terra onde deveria ter aprendido o português.  Também não é por acaso que os grandes mentores da “causa crioula” fugiram para os Estados Unidos e, de lá, em forma de ganha-pão, berram de palestra em palestra, sarnam os ouvidos aos emigrantes sobre a necessidade de implementar a sua grande bandeira. O crioulo, esse grande oprimido, precisa de ser salvo das amarras dos próprios cabo-verdianos. Mas, curiosamente, ninguém os ouve a incentivar os emigrantes a dominar o inglês para melhor se integrarem na sociedade americana. Não, para eles, o importante é que a sua cruzada linguística crioula continue, nem que seja às custas do futuro de um país inteiro.  


Mas há um pequeno detalhe que o José e os seus catedráticos iluminados parecem ignorar: o crioulo não é mais do que português mal falado, precisamente porque foi mal entendido pelos escravos e depois reproduzido pior ainda. Se fosse essa língua maravilhosa que agora querem impingir, por que razão Portugal não a adotou? Já imaginaram? Portugal, depois de séculos de domínio colonial, resolvia adotar o crioulo como língua oficial porque, afinal, tinha mais sabor?  

A origem do crioulo está na Guiné, dizem. — ( Lá estão os comunistas a acertar o passo com a Guiné, sempre a Guiné no nosso caminho) — e, de facto, em termos linguísticos, existem crioulos em várias partes do mundo. Mas o que o José e companhia querem fazer não é preservar um património linguístico – é transformar o crioulo numa ferramenta de guetização intelectual. Uma língua oficial que, em vez de elevar, limita. Um dialeto que, em vez de abrir portas, fecha-as.  

Eles aprenderam mal, não entenderam e agora andam a dar palestras para garantir que os outros também não aprendam.  

Reafirmo, nada tenho contra o dialeto na rua. Mas tenho tudo contra o dialeto na escola.  

E já que vivemos na era da liberdade de expressão, onde eles podem dizer barbaridades e ser aplaudidos, eu também tenho o direito de dizer que o caminho que querem para Cabo Verde não é o melhor. Aliás, nem sequer é um caminho – é um beco sem saída.  

Se há algo que a História nos ensina, é que o conhecimento é poder. E o poder, meu caro José, não é o crioulo.  

Para ti, José, aprender, ao que parece, é um conceito demasiado complexo para quem fez da ignorância a sua bandeira.  


Adérito Barbosa in olhosemlente.blogspot.com

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"Eu não sou como muita gente: entusiasmada até à loucura no princípio das afeições e depois, passado um mês, completamente desinter...