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segunda-feira, 27 de outubro de 2025

Aqui com os meus botões





Lembro-me de Mahmoud Amin Ya’qub al-Muhtadi. O artista foi à festa de 7 de Outubro matar civis em nome do Hamas. Depois do serviço, fugiu da Faixa de Gaza como se tivesse asas. Atravessou o Atlântico e apareceu na América. Lá fez-se de vítima, limpou o currículo, varreu o passado, ensaiou o papel de coitadinho e conseguiu viver como um senhor na Louisiana — até a Mossad lhe bater à porta.

Olho para isto e penso: quantos Mahmouds deste calibre já se instalaram em Portugal? Quantos circulam por aí, de sorriso aberto, com cartão de residência no bolso e subsídio garantido? Portugal não perguntou nada, não confirmou nada, não investigou nada. Foi um fartote.

Ouvi também que o pessoal do antigo SEF, engolido pela PSP, anda irritado porque terminou o prazo de afectação e o Governo, depois de prometer integração na PJ, afinal já veio dizer que não. Cá para mim, o Governo enganou-os à grande.

Noutro canto do país ficámos a saber que, na quinta do poder judiciário, o juiz Ivo Rosa foi investigado quatro vezes pela porta do cavalo pelos magistrados do Ministério Público, tudo porque desmontou a tese da Operação Marquês. Chafurdaram na vida do homem até dizer chega. Se fizeram isto a um juiz, imagine-se o que não farão ao comum português.

Diz-se à boca cheia que o famoso Luís Rosa-dos-dossiers, velho operacional das sombras no Ministério Público, foi quem puxou a espoleta da denúncia, a mando de quem lhe sopra ao ouvido. Mesmo que não tenha sido ele, o país ficou desconfiado: desde que o juiz pobre saiu do TICÃO, anda tudo amuado. É isto que me tira do sério: um país fascinado com novelas.

Entretanto, temos um surto crescente de filhos que espancam os pais, esfaqueiam familiares e até matam a mãe porque a mãe exige que estudem. Fruto da modernice pedagógica baptizada de parentalidade positiva. Traduzida para português claro: a canalhada faz o que quer desde pequena e ninguém pode contrariar, que é crime. Assim crescem pequenos ditadores. Agora aí têm o resultado das modernices.

Para cúmulo, até chamar os bois pelos nomes se tornou proibido. Inventaram um festival de eufemismos. Já não há pobres: há pessoas sem meios. Já não há criminosos: há pessoas em reintegração. Já não há violentos: há cidadãos com histórico de impulsividade. Já não há fronteiras: há portas de visita. Tudo embrulhado em palavras mansas, para que ninguém se ofenda. Horror à verdade, pavor do conflito, paixão pela ilusão.

Se o Mahmoud tivesse escolhido Lisboa em vez da Louisiana, a esta hora já teria T2 camarário e talvez fosse mascote oficial da bondade — até ao dia em que voltasse ao seu desporto preferido. O país passou anos como condomínio de porta aberta, porque alguém perdeu a chave. Agora acordam com o prédio vandalizado e fingem surpresa. 

Eu já não tenho energia para fingir surpresa com nada.

Ninguém aprende. A comunicação social vende ilusões de manhã à noite. Discutem as mudanças no Benfica, falam do Benfica, sonham com o Benfica — e no fim nada muda. Mas os sócios ficam felizes porque há recorde. O país real, esse, ficou à porta das TVs. 

Adérito Barbosa In olhosemlente.blogspot.com

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