Há dois conflitos iminentes no mundo, na atualidade: um entre a Rússia e a Ucrânia e um outro entre a China,Taiwan e Estados Unidos da América.
Curiosamente, o conflito que mais preocupa os EUA é a tensão entre a China e Taiwan, porque envolve diretamente os Estados Unidos, país aliado militar e tecnológico de Taiwan; digo tecnológico, porque é Taiwan que fabrica os microprocessadores para o mundo inteiro. Se a China deitar a mão a essa tecnologia, será uma tragédia para o Ocidente. No entanto, até agora, a China nunca conseguiu copiar essa tecnologia.
O que mais desperta a atenção das pessoas e dos media nos Estados Unidos e na Europa é o conflito da Rússia com a Ucrânia e isso não é à toa, porque a Rússia é um inimigo histórico dos Estados Unidos. Desde a Segunda Guerra Mundial, principalmente após várias décadas de Guerra Fria, os americanos dão muita atenção aos movimentos da Rússia, apesar de hoje em dia a maior ameaça para a nação americana ser a China e não a Rússia; mas não vou alongar-me sobre este assunto aqui. Vou focar-me no primeiro conflito referido.
Afinal, o que é que a Rússia quer com a Ucrânia?
De uma maneira mais simples possível, vamos começar pelas personagens:
1ª- Rússia: É um país que começa na Europa e se estende pela Ásia, até ao Japão e às Coreias; é o maior país do mundo em extensão territorial e faz fronteira com catorze países.
2ª- Ucrânia: É o segundo maior país da Europa em extensão territorial e historicamente fez parte da Rússia, tendo feito parte, por muito tempo, da União Soviética. Foi parte importante do Império Russo e muitos até argumentam que a civilização russa nasceu na Ucrânia.
3ª- NATO: Esta personagem é uma instituição que foi criada depois da Segunda Guerra Mundial, como se fosse um clube de vários países da Europa, ao qual se juntaram os EUA e o Canadá; é mais ou menos como um exército comum desses países, que tem por função defender os interesses desses países no mundo.
O que acontece é que a NATO foi criada principalmente para os aliados se defenderem da Rússia, depois da Segunda Guerra Mundial. Nas últimas décadas vem expandindo as suas bases militares para locais cada vez mais próximos das fronteiras russas e vem englobando países que faziam parte do bloco soviético durante a Guerra Fria, para além de também construir bases militares nesses países. Obviamente que a Rússia não fica nada feliz com esta movimentação de tropas e de armamento da NATO. A Rússia quer manter a NATO o mais longe possível das suas fronteiras, porque a considera seu potencial inimigo.
Então o que é que a Ucrânia tem a ver com isto? Na Ucrânia, outrora importante centro industrial russo, passam os gasodutos para a exportação de gás natural da Rússia para a Europa, o que é de extrema importância económica; do ponto de vista geográfico, a Ucrânia tem funcionado como uma “zona de segurança”, uma barreira para o avanço de forças militares sobre a Rússia.
Os cães grandes desta história são a Rússia e a NATO; a Ucrânia tem um azar dos diabos, ao ficar no meio do caminho e ter que escolher por que lado optar; contudo quero contar e fazer entender o que é essa treta entre Ucrânia e Rússia.
Tudo começou lá na Idade da Pedra, quando um homem deu uma bofetada noutro - a coisa gerou um sentimento de ódio que se transformou em ressentimento que, por sua vez, evoluiu para um sentimento de injustiça para quem levou nas trombas.
Paralelamente, no agressor, naquele que bateu, cresceu uma certa soberba, uma sensação de impunidade e até chegou a ganhar gosto pela porrada.
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Comecemos pelos acontecimentos a partir da Primeira Guerra Mundial; olhando para o mapa da Rússia antes do começo da Primeira Guerra Mundial, vemos que o império Russo fazia fronteira com a Alemanha e não existiam países como Ucrânia, Polónia, Lituânia, Estónia, Bielorrússia e Geórgia. Aquilo era tudo Império Russo - na verdade, nem a Finlândia existia. Pouca gente sabe, mas a Finlândia fazia parte do Império Russo também.
A Rússia era o país que mais crescia no mundo, sendo, porém um país predominantemente agrário, enquanto a Alemanha era já um país bem mais industrializado; este facto fez toda a diferença em termos de guerra, porque a Alemanha produzia equipamentos e munições rapidamente e ao mesmo tempo também conseguia produzir suprimentos, para manter a população e o exército em ação, o que na Rússia não acontecia.
Então o que aconteceu? Imaginem! O czar Nicolau II, imperador russo, mais conhecido pelo pequeno Nicky, foi com o seu exército para cima da Alemanha e do império austro-húngaro. Resultado? Sofreu uma estrondosa derrota; o seu Exército foi completamente dizimado e a população da Rússia ficou tão mal que ele, o Czar, acabou por abdicar do trono.
Na Rússia existia um movimento de descontentes, que tinham como objetivo matar o Czar e família, tirar a Rússia da guerra e instaurar o comunismo na Rússia e em toda a Europa; por outro lado a Alemanha estava desesperada por acabar a guerra com a Rússia, porque tinha também a frente ocidental reforçada devido à entrada dos Estados Unidos na Primeira Guerra Mundial.
Então o que fez a Alemanha? Foi buscar um ativista comunista russo, um revolucionário que estava exilado na Suíça, enfiou-o num comboio com uma montanha de dinheiro e mandou-o para São Petersburgo, para ajudar o movimento bolchevique a ganhar o poder e a retirar a Rússia da guerra, de modo a que a Alemanha pudesse focar-se somente com a frente ocidental, que incluia a Inglaterra, a França e os Estados Unidos. Qual era o nome desse cidadão? Vladimir Ulyanov, Lenine.
Lenine acabou por derrubar o czar e formar a União Soviética; organizou o movimento bolchevique e foi bem sucedido. Como tinha prometido, tirou a Rússia da guerra, perdendo a guerra. O perdedor, a Rússia, precisava de convencer a Alemanha a parar de bater e como é que fez isso? Sentou-se com os representantes do inimigo e negoceia um acordo de paz, perguntando ao vencedor o que quer. Neste caso, o representante russo era Trotsky e teve que sentar-se com um General alemão, para ver o que é que a Alemanha queria para parar com a guerra! O General alemão obrigou os russos a abrir mão de 2 milhões e meio de quilómetros quadrados, onde se situavam simplesmente Ucrânia, Bielorrússia, Lituânia, Geórgia, Estónia, Letónia e Finlândia, ficando assim sem um terço da sua população. Até os próprios políticos alemães acharam que as imposições do General alemão, foram humilhantes e que isso poderia criar um sentimento de ódio, de injustiça em quem perdera, e que acabaria por provocar outras guerras no futuro como veio a acontecer com a própria Alemanha. Mas porque é que Trotsky, que era um homem inteligente, aceitou assinar um tratado tão mau para a Rússia? Porque é que a Alemanha perdeu a guerra poucos meses depois? Estando a Rússia do lado dos vencedores, porque é que Trotsky aceitou perder tanto terreno e tanta população?
Porque os Russos acreditavam que um dia, com o tempo e com discrição recuperariam tudo novamente.
E com o tempo, a Rússia, que sentiu que aquele tratado com a Alemanha não fazia sentido nenhum, começou a recuperar todos os territórios (com exceção da Finlândia) e a União Soviética voltou a unificar-se, tendo sobrevivido até 1991, por mais 69 anos.
Com o fim da União Soviética e do comunismo, a treta tinha tudo para ter acabado de vez, pois a Rússia já deixara de ser comunista e já não existia a União Soviética. Era óbvio que os líderes da época, Gorbatchov e Boris Yeltsin tinham boas relações com o Ocidente e alguma vontade de se integrarem, mas a Europa sempre considerou a Rússia o patinho feio da História e manteve-a isolada lá longe, no canto.
Nos anos 2000 a União Europeia começou a englobar os países comunistas ex-membros da URSS e a Rússia, obviamente, não ficou feliz. Começou a sentir-se cada vez mais ameaçada, porque a UE instalou bases militares nesses países, chegando cada vez mais perto do seu território. Como a Rússia estava muito desorganizada, pois tinha acabado de sair de um período de recessão muito grande devido ao fim da União Soviética e não tinha muita força para fazer frente à Nato, a Rússia deixou a coisa correr.
Ao longo das duas décadas seguintes, a Rússia cresceu muito economicamente e em 2013, quando a Ucrânia estava prestes a assinar um acordo para estreitar relações com a União Europeia, o presidente da Ucrânia não assinou o tratado e no dia seguinte houve uma revolta, porque supostamente a população quereria entrar para a União Europeia e o presidente quis ficar do lado dos Russos.
É isso que os media ocidentais dizem que aconteceu, enquanto a Rússia diz que, na realidade, foi um movimento financiado pelos países do Ocidente.
Grande parte da Ucrânia é povoada pela população que descende dos russos, falam russo, sentem-se russos. Em 2014 fizeram um referendo, às três pancadas, na Crimeia e a grande maioria da população votou na reunificação com a Rússia; pela calada da noite, a Rússia foi com o seu exército e tomou a Crimeia. “Nos corações e mentes das pessoas, a Crimeia sempre foi e permanece como uma parte inseparável da Rússia” “..tem uma importância vital, uma importância histórica para todos nós”, afirmou o presidente russo, referindo-se à Crimeia, como um local aprazível, o seu Algarve, onde os maiores pensadores russos passavam grandes temporadas.
A comunidade internacional achou que o referendo era uma farsa e contestou a anexação
do território pelos russos; estes, por sua vez, alegaram que se tratou simplesmente de uma reunificação, lembrando que a Ucrânia fazia parte do império russo.
Numa entrevista recente, Putin questionou o seguinte:
A NATO vem ao meu quintal plantar mísseis que, se forem disparados, demoram entre 6 a 10 minutos para chegarem ao coração de Moscovo e vocês não querem que eu faça nada? E se eu for colocar mísseis na fronteira dos Estados Unidos, eles não vão fazer nada? E se eu colocar o meu exército na fronteira do Reino Unido, ninguém vai fazer nada? Vocês vêm aqui estreitar a relação com o meu vizinho mais próximo e instalar aí bases militares e esperam que eu não faça nada?
Este é o argumento oficial da Rússia, mas o que a maioria dos especialistas em política internacional defendem é que, no fundo, Putin quer ver de volta todo o território do império russo, ou que, pelo menos, quer reaver parcialmente o território que era originalmente da URSS. Neste contexto de grande tensão, os especialistas acham que existe uma chance, na ordem dos 78%, de a Rússia invadir a Ucrânia.
Na minha opinião, isso será inevitável!
Adérito Barbosa in olhosemlente.blogspot.com