poeta.adérito.barbosa.escritor.autor.escritor.artigos.opinião.política.livros.musica.curiosidades.cultura Olhosemlente

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Coisas da Terra sem Moedas para o Elefantezinho



A aldeia de Santa Bárbara de Nexe, que passou a freguesia no século XVI, ocupa a parte noroeste do concelho de Faro, fazendo fronteira com três sedes de concelho -  Faro, Loulé e S. Brás de Alportel. Com cerca de 38,22 km2 de área, tem aproximadamente 108,4 hab/km²; é a freguesia com menos população, estando classificada como área de baixa densidade populacional, segundo o último censo. Situa-se no Barrocal algarvio e dista a 10 km das praias.
Santa Bárbara apresenta-se vivaça,  muito formosa e, de olhos postos no Parque Nacional da Ria Formosa, é uma sentinela atenta, que mira do alto os corpos roliços e embuchados que lá em baixo se dão ao prazer do sol, libertos do linho que no inverno maltratou e sufocou a beleza dos contornos com casacos, samarras e sei lá mais o quê.
Agora, como que numa de vingança, lá estão castigando o corpo ao sol,  expondo-o sem reserva aos olhares indiscretos dos primos do Zezé algarvio.

O ventre de Santa Bárbara está grávido de turistas, a aldeia está cheia de vida - há jornais, revistas e restaurantes, anúncios de todo o género, mas tudo em inglês. Os bancos do Rossio cá do sítio parecem ter dono. São sempre os mesmos velhotes que, pela tarde, tomam fresco debaixo das árvores;  já nem contam os dias que por eles vão passando, mas contabilizam os passos de qualquer forasteiro que pare por aqui.
Bom dia, onde fica o supermercado?
Vá por aqui e lá adiante fica à esquerda, disse um deles.
O supermercado é nas bombas, gritou outro.
Ouça o que eu digo. O Sr. agora, abalando daqui, corta na estrada que vai para a esquerda. Logo aí encontra uma bomba de gasolina. O supermercado fica junto às bombas, do lado do pôr do sol, ordenou o mais intelectual.
Um bocadinho mais abaixo plantaram o Estádio do Algarve e construiram o Parque das Cidades para as moscas.

A presença humana nesta localidade remonta à transição do Paleolítico Médio para o Paleolítico Superior e já lá vão 30.000 anos. Primeiro foram os Fenícios, depois os Romanos e depois os Visigodos da Hispânia, mais tarde conquistada pelos Mouros e incorporada no Algarbe Alandalus.
A freguesia viria a pertencer ao Reino de Portugal durante o período final da Reconquista dos “Tugas” aos Mouros, em 1271, pelo Rei D. Afonso III. A mais antiga referência escrita ao lugar de “Neixe” parece ser de 1291, numa delimitação dos termos (concelhos) de Faro e Loulé. Refira-se ainda que a construção da Igreja Matriz começou no século XIV, no lugar de uma antiga ermida já existente, local de romagens regionais, onde se dizia que aconteciam milagres.
O habitante mais antigo e conhecido foi o cidadão romano Sexto Numísio Eros (do século II), referido numa lápide funerária local.

As charolas são a manifestação cultural mais tradicional e genuína da freguesia de Santa Bárbara de Nexe, sendo únicas na região, quer pelo improviso, quer pela ausência de simbologia religiosa.
Nos primeiros dias de cada ano, grupos de homens e/ou mulheres, acompanhados de instrumentos (acordeão, castanholas, pandeiretas, ferrinhos e por vezes clarinete e saxofone), actuam em Festivais em Santa Bárbara de Nexe, Bordeira e arredores, casas particulares de amigos e nos cafés da zona, entoando cantigas e lançando quadras improvisadas (“vivas”) saudando o Ano Novo e os amigos, num clima de amizade, alegria e alguma crítica social e política.

As charolas da Terra de Nexe, em meados do século XX, atingiram os mais altos patamares da música centrada no acordeão, com a participação dos mestres acordeonistas bordeirenses José Ferreiro Pai e João Barra Bexiga, assim como da poesia popular, com a participação de grandes poetas populares como António Aleixo e Clementino Baeta.
Aqui não é só historia, não é só coisas lindas, nem lindas pernas e nem só mamas maravilhosas. Também há cá gente feia, horrível e uma super preguiçosa e molenga, como aquela empregada das bombas de gasolina merecedora de viver no desemprego, mas sem direito ao subsídio.

Bom dia, por favor, pode trocar-me esta nota de dez por moedas, para lavar o carro, ali no elefantezinho?
Tenho pena, mas não tenho moedas.
Não tem moedas?
Não tenho, venha lavar amanhã.
Mas eu quero lavar o carro hoje.
Pois, pois quer, mas não pode.
Já à saída reparei na máquina do tabaco e então pensei que ali estava a solução para o meu problema. ” Meto uma nota, anulo a operação ou tiro um maço e a máquina dá-me moedas.” Com esta genial ideia dirigi-me para a máquina.
Olhe minha senhora, pode ligar a máquina por favor? - Ela muito ensonada, com a cara apoiada na palma da mão, pega no comando e começa um ritual pachorrento com acenos para a máquina, de comando na mão. E avisa:
Só quando acender a luz vermelha!
Sim, ok, ainda não está ligada, disse eu e ela continuava a acenar com o comando, com a a cara apoiada na palma da mão esquerda.
Ó minha senhora desculpe, não ligou a máquina...
Tem que vir buscar o comando.
Eu? Eu é que vou buscar o comando para ligar a máquina? Isso é trabalho seu!
Você já viu quantas pessoas vêm cá tirar tabaco? E se de cada vez que vem uma pessoa eu tiver que ir aí, já viu o que eu andava?

Ora aqui está uma pessoa merecedora de viver no desemprego, sem direito a subsídio de desemprego.

Adérito Barbosa in olhosemlente

Sem comentários:

Enviar um comentário

Publicação em destaque

Florbela Espanca, Correspondência (1916)

"Eu não sou como muita gente: entusiasmada até à loucura no princípio das afeições e depois, passado um mês, completamente desinter...