Ontem foi um dia diferente. De Lisboa vieram duas amigas almoçar connosco. Vieram sobretudo provar uns bolinhos franceses trazidos de França para a minha mulher. Os bolinhos Macarons são muito bons. As minhas amigas são umas tipas danadas para o passeio e não se fizeram de rogadas. Chegaram por volta do meio-dia, e fomos então para um restaurante muito simpático, o Forno da Avó. Eu queria ir para o Ribeirinha, mas outras vozes se levantaram, e não consegui alterar a azimute do restaurante.
Sentados à mesa, a conversa fluiu. Falámos dos coitadinhos dos palestinianos, dos desgraçadinhos do pessoal das zonas sensíveis de lisboa e arredores, das miseráveis televisões portuguesas, dos jornaleiros e comentadeiros fazedores de opinião, da falta de informação isenta, do bonitão jornaleiro Ricardo Costa da SIC, que chamou maluquinhos aos apoiantes de Trump. Ou seja chamou malucos aos 76 milhões de eleitores que votaram Trump.
Falámos também dos youtubers, que todos os dias se tornam mais interessantes em matéria de informação. Até debatemos sobre as lésbicas e os paineleiros que insistem em nos convencer que o casamento gay é uma coisa natural e bonito de se ver. Isto surgiu a propósito de uma delas concordar com a minha homofobia. Dizia ela que o companheiro, também escritor, tem um ponto de vista diferente do meu sobre os gays. Ele não gosta de gays, mas diz que não o incomodam, ao contrário de mim, que me incomodam e muito.
A conversa acabou por se focar nos coitadinhos palestinianos, nos maus israelitas, nos frouxos dos europeus, dos bonzinhos ucranianos e nos monstros russos - depois dei o exemplo de El Salvador. Elas ficaram curiosas e acabei por contar a história do presidente de El Salvador, Bukele.
El Salvador é um país pequeno, mas com uma história carregada: guerra, desigualdade social e, nos últimos anos, o terror imposto pelas gangues. Um lugar onde o medo se tornou parte do dia a dia. Mas aí surge um nome que vira tudo do avesso: Nayib Bukele. Jovem, fora da norma e cheio de ideias, ele chegou para romper com a política tradicional e agitar as estruturas do país.
Bukele nasceu a 24 de julho de 1981, na capital, San Salvador. Vem de uma família de ascendência palestina, com ligações ao mundo empresarial. Antes de entrar na política, geria negócios da família, mas cedo se percebeu que tinha talento para comunicação e inovação. Em 2012, deu os primeiros passos na política, tornando-se presidente da câmara de Nuevo Cuscatlán pelo partido de esquerda FMLN (Frente Farabundo Martí para a Libertação Nacional). O bom desempenho levou-o a ser eleito presidente da Câmara de San Salvador em 2015.
Bukele nunca foi de ficar em linha com o sistema. Começou a criticar os partidos tradicionais, incluindo o FMLN, e foi expulso do partido em 2017. Isso não o intimidou: em 2018, fundou o partido Nuevas Ideas, um movimento político que atraiu jovens e eleitores fartos de décadas de corrupção e governação ineficaz. Sem o apoio necessário para avançar sozinho, juntou-se ao partido GANA (Grande Aliança pela Unidade Nacional)e concorreu às eleições presidenciais em 2019. Venceu com larga vantagem, pondo fim ao domínio histórico dos partidos ARENA (direita) e FMLN(esquerda).
O PSD E O PS lá do sítio.
As gangues de El Salvador, conhecidas como maras, têm origem num contexto de imigração e deportações dos Estados Unidos. Durante a guerra civil salvadorenha (1980-1992), milhares de salvadorenhos fugiram para os EUA, especialmente para Los Angeles, onde enfrentaram discriminação e violência de gangues locais salvadorenhos entenda-se. Muitos jovens reagiram e formaram as suas próprias gangues, como a Mara Salvatrucha (MS-13) e a Barrio 18, inspiradas pela cultura de rua americana.
Nos anos 90, os EUA endureceram as políticas de imigração e começaram a deportar milhares de imigrantes ilegais, incluindo membros das gangues. Estes indivíduos regressaram a um país devastado pela guerra, com pobreza extrema e falta de oportunidades, o que acabou por alimentar o crescimento das gangues. Rapidamente, estas organizações passaram a controlar bairros inteiros, extorquir comerciantes, recrutar jovens à força e usar violência brutal para consolidar o poder.
As maras, agiam como governos paralelos em várias comunidades. Controlavam o tráfico de droga, cobravam impostos (extorsões) a moradores e comerciantes e usavam violência extrema para impor respeito. As atividades incluíam raptos, abusos sexuais e homicídios, e muitas vezes forçavam famílias inteiras a abandonar as suas casas.
Em 2015, a taxa de homicídios atingiu os 105 por cada 100 mil habitantes, um número aterrador.
Quando Bukele chegou ao poder em 2019, fez da luta contra as gangues uma prioridade absoluta. O plano, mais conhecido como Plano de Controlo Territorial, começou com um reforço massivo da presença da policia militar nas ruas, principalmente nas zonas mais afetadas pela violência – aqui seriam as “zonas sensíveis”, para não ferir os ouvidos da burguesia portuguesa. Além disso, investiu pesado em tecnologia, monitorização e inteligência artificial para desmantelar as redes criminosas.
O ponto que mais marcou foi a sua política de tolerância zero. Bukele começou a atacar as gangues sem tréguas, cortando a comunicação entre os líderes presos e os seus subordinados nas ruas. Construiu uma das maiores prisões da América Latina, o CECOT (Centro de Confinamento do Terrorismo), onde dezenas de milhares de membros de gangues foram enviados sob condições severas. Nada de visitas, encontros amorosos ou colchões. Os gangues estão misturados, sem regalias nenhumas iguais as que eles davam às suas vítimas.
Outra medida polémica foi o Estado de Emergência implementado em 2022, que suspendeu garantias constitucionais como o direito de defesa e permitiu detenções em massa. Em poucos meses, milhares foram presos, com aprovacao de quase todo o Parlamento.
Bukele foi eleito democraticamente e tem apoio massivo, com índices de aprovação acima dos 80%. Ele próprio ironizou, chamando-se “o ditador mais cool do mundo”.
Às críticas de ONGs e elites políticas, Bukele respondeu: Onde estavam vocês quando as gangues controlavam o país e assassinavam os nossos? A minha política é defender o básico: - o direito à vida e à segurança dos salvadorenhos.
Enquanto isso, em Portugal há locais onde a polícia não entra, e alguns palermas se manifestam a favor dos direitos da bandidagem.
Onde estão os direitos do condutor da carris queimado, dos polícias esfaqueados e mortos a tiro e daqueles que não vivem nas zonas sensíveis?
Adérito Barbosa in olhosemlente.blogspot.com
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