12 de novembro, dia soalheiro. Um autêntico dia de verão.
Foi aqui, neste sítio tranquilo, que ao longo destes meses andei de bicicleta, ou a pé, quase todos os dias, por ser um sítio plano, por não haver carros e com isso evitar ganhar peso. Sei que não é permitido andar-se de bicicleta aqui a determinadas horas e, por isso mesmo, alguns dos polícias que zelam pela segurança daqueles que fazem footing, ainda me fizeram alguns auto-stop.
Nessas operações de auto-stop não pedem documentação. Umas vezes dizem que não ê permitido andar de bicicleta, outras vezes perguntam se não vi a tabuleta de proibição e outras passa-se por eles e não dizem nada. Sempre que fui abordado refilei, dizendo que não tenho outro sítio para andar, ao que eles ripostavam sempre:
- Ande na estrada, ou nas picadas, ou nos jardins.
- Eu não posso andar de bicicleta na estrada, porque posso levar uma traulitada de algum carro e nas picadas também não posso, porque acabei de ser operado pela 4ª vez à coluna, logo, não posso sujeitar a minha coluna a grandes solavancos; mostrava-lhes então a cicatriz ainda fresca da costura e o inchaço que ainda ostento no sítio onde o bisturi do médico cortou sem piedade aquela zona, naquela tarde do dia 15 de Julho.
- Eh pá, essa costura é grande; isso está alto que se farta; isso não vai baixar? Isso dói? Perguntavam os polícias.
- Não, isso aí não vai baixar nunca mais; não vai baixar porque aí debaixo estão uns parafusos e uns travessões em titânio, que me colocaram para fixar as vértebras uma à outra.
- Você está lixado com isso! Onde é que arranjou essa brincadeira? Perguntou um dos agentes mais afoito.
- Eh pá, isto foi nos Páras.
- Você é militar? O pára-quedas não abriu, foi? Perguntava, curioso, um dos agentes.
Depois de responder afirmativamente que sim, que era militar, expliquei que, se o para-quedas não tivesse aberto, a esta hora já eu estava a fazer tijolo há muito. Então, contei aos recentes amigos da PSP DE OEIRAS que sofri um acidente em para-quedas em 91, quando ainda era um jovem e tinha apenas 35 anos. Daí para cá, já somei quatro intervenções à coluna, sem contar com as outras ao joelho, aos testículos e ao braço.
- Um martírio!... desabafei.
Os agentes, todos eles jovens e já sensibilizados, abanavam o esqueleto como quem diz: - Você está fodido!
No decorrer da conversa, dizia um deles que o que gostava mesmo era de ter sido paraquedista; outro comentava que aquilo é que era tropa a sério, enquanto outro acrescentava:
- Eu nem pensar, saltar de avião nem empurrado!!
Contei-lhes que era DFA e passei a contar com a compreensão e simpatia dos nossos agentes da PSP que passaram a fazer vista grossa, quando me viam andar de bicicleta aqui no Passeio Marítimo de Oeiras.
- O quê!?... Eu tenho que ir ao hospital falar com quem!? Peguei em mim, liguei para o Hospital da Luz, marquei a consulta e 30 dias depois já estava operado e em casa a recuperar.
Passei hà dias no Estado Maior da Força Aérea em Alfragide e fui à Secção de Justiça e Disciplina para me inteirar das papeladas necessárias para reabrir o meu processo. O TCOR Domingos, um dinossauro da justiça da FAP (no meu tempo, era ele em Alfragide e eu em Tancos, quais homólogos justiceiros), recebeu-me com parcimónia. O engraçado é que se lembrava perfeitamente do meu processo. Deu-me as indicações dos passos que tinha que dar.
Na sequência disso, hoje liguei para o hospital, à semelhança do que fiz há quatro meses e pedi para marcar uma consulta de neurocirurgia; esclareci que sou DFA, blá, blá, blá e que o meu objectivo era mostrar os exames e o resultado da cirurgia e que pretendia reabrir o meu processo, blá, blá, blá por aí fora. A resposta foi esta:
- Não podemos marcar consulta de neurocirurgia. O Sr. tem que vir ao hospital falar com o chefe dos serviços de neurocirurgia.
No dia 19 vou ao Hospital das Forças Armadas; pelo cheiro da coisa, fiquei com a impressão que esta instituição tresanda à fragrância de uma cavalariça.

"Na tropa, quando há um acidente, o acidentado é o primeiro a perder. E quando se ganha alguma coisa, o acidentado é o primeiro a não ganhar".
Vou ver se isso é verdade, depois conto-vos como foi.
Adérito Barbosa in olhosemlente
Adérito Barbosa in olhosemlente
Sem comentários:
Enviar um comentário