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domingo, 7 de março de 2021

Não deixes que anunciem a minha morte



Sonhar acordado não chega 

não basta porque nem dá pra acreditar

Essa que não pára de crescer

é uma história que sabia complicada.

E eu não sabia bem porquê 

nem mesmo o porquê.

É um fardo da culpa  

que eu carrego na alma, 

me encolhe

e me verga de cansaço.

É uma dor dos diabos a que sinto...

É a maldade do tempo 

a fazer das suas.

Quis que te afastasses de mim

e eu não consigo dormir.

Fantasmas trauteiam um blues 

acelerando o compasso

é um tormento...

Sinto-me frio com esta solidão...

Deitado na cama

de olho na quinzena do terço

e de telefone na mão

sei o que te quero pedir.

Não me deixes só!

Bastava-me ouvir-te.

Mas a esta distância não dá!

E era real, tudo é irreal, mas eu fui quem inventou as memórias

do teu cabelo a branquear 

esperava saber desenhar um dia 

as tua rugas assim que surgissem.

Estudei pintura para pintar os teus cabelos de branco 

ainda estou à espera, confesso,

de ver-te subir as escadas da estação outra vez.

Foi o tempo com a  sua maldade

quis que fosse assim!

Nublou a forma como subias em mim 

revi os segredos que já não 

são meus 

mas que me pertenceram

e senti saudades...

Tenho palavras não ditas engasgadas ...

esta paixão é antiga e o tempo nunca a apagou.

E quando chegam as noites e  eu não consigo dormir - são sempre iguais... não consigo!

Com telefone na mão sei que não ligas mais, mas fico com ele na mão

nesta e noutras noites.

Nem a televisão ligada 

faz adormecer a espera. 

Olho o tecto com telefone na mão 

e tu não chamas.

Apetece ligar, mas não tenho forças 

para ouvir “o número para a qual ligou, está desligado, deixe mensagem”

Só queria pedir,

- não deixes que anunciem a minha 

morte nas redes, nem nos jornais!

Se não estás, 

então quero morrer sozinho

como nasci!


Adérito Barbosa in olhosemlente.blogspot.com

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