A
cisma do Sr. Joaquim
Hoje acompanhei a minha
sobrinha ao Médico. Apesar de maior e vacinada lá fui eu, orgulhoso,
acompanhá-la a um médico meu conhecido e amigo.
Apesar de reconhecer
competência superior ao médico não gostei da rececionista. Era uma daquelas
pessoas que nada tem de sobra no que diz respeito à inteligência. Na sala de
espera estavam quatro senhoras e o Sr. Joaquim, marido de uma delas e
proprietário de umas dores nas costas que eu nem dadas as queria.
O Sr. Joaquim mal se conseguia pôr direito, tamanha era a dor e evidente pelos seus suspiros. Mesmo assim, meti conversa com ele. Foi dizendo que em Portugal muitos velhos com a idade dele morrem todos os dias nos hospitais por falta de assistência médica. Perguntou-me o que eu achava daquilo e afirmou que era uma tristeza uma pessoa chegar àquela idade e ir morrer nas urgências. Ansioso, ficou à espera que eu dissesse que era verdade o que ele dizia.
O Sr. Joaquim mal se conseguia pôr direito, tamanha era a dor e evidente pelos seus suspiros. Mesmo assim, meti conversa com ele. Foi dizendo que em Portugal muitos velhos com a idade dele morrem todos os dias nos hospitais por falta de assistência médica. Perguntou-me o que eu achava daquilo e afirmou que era uma tristeza uma pessoa chegar àquela idade e ir morrer nas urgências. Ansioso, ficou à espera que eu dissesse que era verdade o que ele dizia.
- Olhe que não Sr.
Joaquim, Portugal tem dos melhores serviços de saúde, toda a gente tem
acesso a assistência médica - dei- lhe o exemplo dos americanos que pretendem copiar
o nosso sistema. O Sr. Joaquim não ficou convencido e manteve-se na dele.
- Morrem muitos velhos
como eu nas urgências – ia dizendo o Sr. Joaquim, enquanto a tosse da rececionista me irritava os ouvidos.- Então para que idade é este jovem? – espicacei o Sr. Joaquim.
- Muitos! - respondeu ele todo inchado, armado em conhecedor do mundo. - Eu... tenho 84 anos e já não é brincadeira nenhuma. E você?
- Eu!? Que idade me dá?
- 37 anitos - disse ele todo pimpão.
- Brincalhão! Grande brincalhão que você me saiu.
Do outro lado da sala, a mulher do Joaquim que conversava com a vizinha do lado mas com um ouvido no burro e o outro no cigano, atenta à nossa conversa, aprontou:
- Você tem 35.
As outras para não ficarem caladas gritaram “40,
43, 45”. O leilão estava a aquecer. - Este rapaz já conta com 54 anos. –
Retorqui, inchado como um sapo. Foi um
"broá" na sala. As velhas perguntaram-me qual era o segredo para
estar assim tão bem parecido. Entretanto, apeteceu-me dizer que o segredo
estava no sexo. Mas fiquei calado. Para ser franco nem eu sei. Só sei que
ninguém me dá a idade que tenho. Com esta conversa fui constatando que as dores
do Sr. Joaquim evaporaram como gasolina. Eis que o chamaram para a consulta. Assim
que se ouviu: “Sr Joaquim, pode entrar!” .as dores voltaram e lá foi ele e sua
gemedeira pelo corredor fora, qual ambulância, avisando o médico que ia chegar um
caso bicudo.
- Então Sr. Joaquim que
lhe disse o médico?
- Mandou-me fazer “um TAC”.
-.Então e as dores já
passaram? - com a mão, fez assim-assim. Bem, pensei eu, fez-se
milagre no gabinete do médico!
Entretanto, a rececionista
continuava com a tosse irritante, e tornara ainda mais irritante, quando tentava explicar como esta lhe tinha surgido.
Enquanto isso, vagueava no Google e em simultâneo recebia o dinheiro que a gestora financeira
do Joaquim lhe entregava, em notas de 20 euros, uma de cada vez, devidamente
alinhadas na mesa, somando um total de oitenta
euros. Após o pagamento, a rececionista pegou no dinheiro e colocou-o na
gaveta. A esposa do Sr. Joaquim pediu-lhe para chamar um táxi. Ela chamou o táxi
e pela conversa fiquei convencido que era alguém conhecido. Chegado o táxi, eis
que a rececionista voltou a pedir o dinheiro da consulta.
- Eu já paguei, eu já paguei! – repetia a velhota em pânico.
- não pagou, não! Eu não tenho aqui o dinheiro.
A velhota começou a tremer e entrou em pânico e as dores voltaram às costas do Joaquim.
Pensei eu: “Bem,
isto está aqui uma açorda... “
- A senhora já pagou! –
intervim em voz alta, salvando os velhotes.
- já? - retorquiu a rececionista
apinocada. - Quando?
- Sim, pagou com quatro
notas de 20 euros! - esclareci eu.- Eu não recebi! - afirmou ela.
- Então conte o dinheiro! - ouviu-se em coro na sala. - A senhora pagou sim!
- Se todos aqui na sala dizem que ela pagou é porque pagou - disse ela, perante a evidência.
O assunto ficou
encerrado. Coitado do Joaquim. Foi ao médico por causa das dores nas costas e
levou a mulher de perfeita saúde. Por pouco que não saía do consultório com as
dores de costas que já tinha, com dores de cabeça, a mulher com problemas
no coração e com menos oitenta euros na carteira, tudo provocado pela rececionista.
A sorte do casal Joaquim foi o facto de na sala todos estarmos atentos.
Se estivessem lá sozinhos, não sei não... Imagino bem como seria...Por este episódio, compreende-se a minha aversão à rececionista. O Joaquim, refeito do susto dos oitenta euros e já a caminho do táxi, arrastando a perna, agradeceu-me e disse mais uma vez:
- Acredite que morrem
muitos velhos como eu nas urgências, por mau atendimento. É uma tristeza....Se estivessem lá sozinhos, não sei não... Imagino bem como seria...Por este episódio, compreende-se a minha aversão à rececionista. O Joaquim, refeito do susto dos oitenta euros e já a caminho do táxi, arrastando a perna, agradeceu-me e disse mais uma vez:
Ninguém consegue tirar
esta cisma ao Sr. Joaquim.
Adérito Barbosa
11 de Setembro 2013
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