O rio que passar na tua cidade
há-de contornar esse teu corpo
de meia idade.
Há-de levar com ele memórias do tempo e melodia na corrente.
Há-de levar sorriso refletido no córrego
e lembranças de mim até se esvair no mar.
Nos dias de sol,
há-de levar espelhos de sonhos,
nos dias de cacimbo, há-de ir frio,
há-de levar a fome que sinto
e a ceia desejada num aconchegado entardecer.
Há-de ir feliz por entre as montanhas ao teu encontro.
Há-de ir de olhos fechados
tateando as tuas margens.
Há-de fazê-lo uma e outra vez
até saber de cor a tua nudez.
Vai inundar-se de lágrimas
Se não o puderes tocar,
vai lento à sombra das árvores do passado,
Vai ansioso por sentir o teu calor
Sem entender a razão dessa paixão.
Ásperos anos esperou,
nunca se esqueceu dos afagos que ainda sente.
Trauteia a canção que o verão canta
Mas logo se arrepia com as incertezas do outono.
Leva com ele um recado meu
já não sei dizer amo-te e
centenas de outras coisas que esqueci.
Escuta, deixa que ele entre em ti
de mansinho que te segrede baixinho que vais entender.
Agarra-o, fica com ele,
acredita no vento e não o negues.
Quem procurou afinal a incerteza?
Sabias que eras casada!
Quem dividiu o teu coração?
Não fui eu, foi o vendaval
que passou fugaz nas tuas veias.
Não fui eu,
Eu sei que dirás que fui eu.
Se alguém me perguntar
Se foi um erro teu?
Direi:
- Eu não sei! Perguntem ao tempo.
Eu já não sei se sei amar.
Adérito Barbosa in olhosemlente
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