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domingo, 11 de agosto de 2013

Carta à Berta


Berta, como estás?

Encontrei uma carta tua na minha caixa de correio.
Respondendo, digo-te:
A minha vida está em constante mudança. Só mantenho intacto o gosto pela paixão que sinto pela minha actividade profissional. Este é, decerto, o mais inocente dos sete pecados capitais que cometo por dia e, como tal, devia ser perdoado. Infelizmente não sou!
Isto porque, queiramos ou não, aqueles momentos fugazes, em que sabemos estar a receber o melhor que a vida tem para nos dar ao perceber o que sentimos por alguém e que somos correspondidos, são momentos de doce e pecaminosa leveza da mente que nos fazem ter a sensação de uma implosão interior agradável.
Seja só ou acompanhado, triste ou estupidamente alegre, essa leve sensação, leva-me a contemplar o mar ou maravilhosos pores-do-sol, a ler um livro, a ver documentários sobre a vida animal, a pensar no Sporting, e também, ou simplesmente, a vegetar sob lençóis, como farei amanhã, domingo, todo o dia.
A preguiça envolverá a mente, sem a qual o domingo, 15 de Agosto, não teria qualquer sentido, (…)simplesmente trabalharia para sobreviver e comprar as coisas que me convenço serem úteis e até as fúteis numa paixão exacerbada
Amanhã vou passar horas a distrair-me, com os jornais, com a TV, com música, sem atender o telefone, mesmo que toque sem cessar, mesmo ainda que o assunto seja a «School». Dizia eu que farei dessa distracção um apaixonado passatempo cultural, pensarei em tudo, incluindo sexo, que é uma paixão que se vai desvanecendo (ao quadrado), viajarei no espaço da mente em distâncias longas que não ultrapassem as quatro paredes desta casa, com a janela aberta para o mar, com vista sobranceira a S. João do Estoril, para me esquecer do que me deveria ocupar a mente (isto só“eu” sei bem o que é!...)
Mas essas coisas têm outras vertentes, talvez mais importantes: o lembrar-me das coisas mais estapafúrdias, mas muito importantes, quando estou a pensar descontraidamente no que vai ser o jantar, ou ainda sobre a última ida ao cinema; o lembrar-me dos raspanetes altivos, ministrados pelos professores, acerca dos maltratos a que se sujeitam ao aturarem o grupo de incompetentes que consegui reunir para trabalharem na School.
É nestes momentos de ócio que faço as minhas maiores descobertas deste meu pequeno mundo!
magino o Newton a pensar que estava a ficar careca e barrigudo, quando PIMBA!..,, uma maçã cai-lhe na testa e lhe revela a existência da gravidade; ou ainda a Florbela Espanca, vagueando pelo seu Alentejo, enquanto pensava calmamente na vida, lá fazia mais um daqueles belos sonetos que todos conhecemos.
Quantos poemas, belos textos, quadros imaginários, pintei no ar com as cores do arco-íris, ou músicas fiz, e que nunca ninguém viu nem ouviu?
São simplesmente momentos ilusórios, mas belos…
E quando penso nela, e ao não me ser indiferente, também é um sentimento que remete para a feiura do gesto e do pecado. Essa expressão é um sentimento que emprego para mim, pela primeira vez –penso não estar errado ao dizer isto também. De facto esta sensação é sofrida e sentida, e é como se de um castigo absurdo me desse - e mereço tê-lo!...
Há quanto tempo eu não escrevia uma carta!
Trabalho muito, estudo à noite, e durmo nas poucas horas que me restam…. E com isso vou-me esquecendo deste prazer que tenho - escrever. É algo que me obrigo a retomar ao ler a tua missiva, (de que, aliás, gostei imenso e que mais adiante retomarei)! E é com esta tua mensagem, dizia eu, que me deste um empurrão para pôr fim ao massacre a que te tenho sujeitado nestes últimos tempos... Muitas voltas dei nestes últimos dias, mas nada… As barreiras são enormes, sim, as consequências…piores ainda. Mas é neste puro momento de ócio, aqui na minha casa, sentado no meu computador, qual homem misterioso que após meditar profundamente sobre o que escreveste, expondo-te abertamente, confiando-me tudo o que sentes, o que pensas, o que passaste, o que sofreste, as tuas alegrias, as tristezas, os dramas e sonhos, que me levaste a descobrir tantas coisas importantes que pensava já ter perdido, ou esquecido. Por isso digo-te: -fazes bem em confiar em mim que jamais vais arrepender-te!
Sei onde estou, como estou, para onde quero ir e como ir. Sei que vou conseguir, mas não sei como!
É como o ovo de Colombo, depois de ele o descobrir, pareceu mais que evidente o que era evidente, mas foi ele o primeiro a descobrir! Assim, controladas que estão as emoções….escrevo.
Minha cara amiga, nunca te esqueças de levar em conta estas palavras, e as outras que em tempos te disse em silêncio, num olhar malandro que cruzámos e que logo percebeste. Usufrui os instantes de paz que possas ter, porque por vezes, a solidão é das coisas mais terríveis que já senti e sinto. Apesar de ter uma vida bastante preenchida, sei do que falo! Nesses momentos vai-se até ao fundo, ou ao topo de nós mesmo, numa espiral que se ergue, sempre a subir até ao infinito, e vai-se, vai-se com medo, com rodeios, e outros medos mais... e não mintas, nunca, especialmente a ti própria! É pecado auto-flagelarmo-nos, mas este, ao contrário das emoções, mais tarde ou mais cedo, cai-nos em cima como uma bomba! E aí pode ser tarde de mais. A verdade sobre nós próprios pode magoar-nos e esmagar…
O olhar melancólico a que te referes, deve ser por eu ficar sem jeito, coisa que não é normal nos Leões como eu, nascido a 15 de Agosto.
Faz-me lembrar Uma Canção: “ eu não sei que mais posso ser, um dia rei outro dia sem comer, por vezes forte coragem de Leão às vezes fraco é assim o coração eu não sei!”…. É assim que eu hoje me sinto, como um gato molhado (…) eu não sei… a vida, às vezes prega-nos partidas esquisitas. As Emoções de que falas, tomam conta de nós, mas não únicas outras incomparavelmente belas que às vezes nos deixam assim… e as barreiras?
Fica bem


Adérito Barbosa
15 de Agosto 2007

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