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domingo, 11 de maio de 2014

Nunca te foste embora

Nunca te foste embora

Não  sei como começar estas palavras que quero dizer-te …
Espero que estejas bem; eu, embora muito cansado das viagens, tanto fisica como psicologicamente, sinto-me bem.
Quanto ao cansaço físico, assim que tomar banho e me deitar, vou recuperar certamente.
No que respeita ao cansaço psíquico, já não tenho assim tanta certeza.
Tu não me sais da cabeça, fazes parte das células que compõem o meu corpo e não me conformo com a ideia de que já não me pertences!
Vivo numa luta tremenda, por não saber nada de ti, nem da tua vida. Sinto que perdi a mulher dos meus sonhos.
Fazes parte do meu dia-a-dia. Se, naquela estação, eu era o homem que idealizaste, acredita também que na mesma estação encontrei a mulher dos meus sonhos, a mulher que idealizei, que amei como nenhuma outra.
Fomos tela, pincel e traço de pintor de estrelas!... Pintámos tudo à pressa e toscamente, convencidos de que o tempo nunca nos faltaria, para retocarmos, mais tarde, com a nossa magia, todos os detalhes.
Ainda sinto o teu cheiro,  ainda sinto o sal da tua pele, o calor dos teus beijos, o sabor da tua saliva. Sei de cor o desenho do teu corpo, os teus contornos e ainda consigo testemunhar com a precisão de um relógio suíço todos os pormenores, do primeiro ao último encontro.
O mundo foi nosso!... De mais ninguém! Tu foste minha e eu teu, sem reservas nem pudor. Fomos inventores da essência do prazer mútuo e da loucura.
Ainda sinto a magia dos momentos na penumbra das noites, quando nos entregávamos à loucura dos filmes que só nós sabíamos realizar. Meu Deus, como foi bom e inesquecível!...  Foi assim em Bordéus , em Lisboa e teria sido também mágico em qualquer parte (recanto deste mundo em que vivemos). As estrelas brilharam tão intensamente que até secaram as nossas lágrimas e calaram os nossos murmúrios.
Ainda te sei de cor! Sei-te de cor, assim como todas as curvas que encontrámos na viagem que fizemos à volta do mundo. Pequeno universo era aquele o nosso!
Agora é um calvário, um suplício, é o fim do mundo! Vivo numa angústia medonha, prescrita por um ditador e vigiado  sem piedade por um carcereiro do amor.
Sei quando a angústia se apoderou de mim e me tornou escravo; sei quando me invadiu a alma e o coração, sem qualquer autorização, ou pedido de licença.
Até quando? Vivo num abismo de escarpas húmidas e frias, cobertas por um manto de nevoeiro denso.
É medonho o que sinto, não sei de nada e nem tu nem ninguém sabe de mim.
Sinto frio nas costas e um calor na testa!
Sinto as mãos trémulas, quando tento convencer-me que já não és minha!
É uma confusão o que aqui vai dentro…
 Também te digo:
- Assim longe, vou aprender a amar-te em paz,
Vou sonhar contigo em paz!
Em paz, vou continuar a desejar-te. Em paz, sozinho no escuro, vou-me lembrar de ti, imaginando a chegada das tuas rugas e o nascer dos teus cabelos brancos.
Em paz, vou saber que mesmo que te tenhas entregado a outro homem...
foi o destino... é o destino e só pode ser sido o destino.
Fico em paz, porque sei que o amarás, também em paz.
Um dia, direi aos meus netos que tu exististe na minha vida e nos separámos, para podermos amar-nos em paz...
Agora só a nostalgia ficou e mais nada resta. Hoje queria apenas abraçar-te para não chorar sozinho.
Se me permites, despeço-me, dizendo-te baixinho, como tantas vezes tu, num sussurro, dizias:
- MEU AMOR!

Adérito Barbosa

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