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segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Fariseus, Judas e Pilatos

Fariseus, Judas e Pilatos 

Há por aí uns zunzuns, segundo os quais os responsáveis pela morte dos Instruendos Comandos podem ter sido o Médico ou um Primeiro-sargento. Será que daqui em diante vamos ver os chefes militares armados em Pilatos, lavando as mãos? 

Os Portugueses são favoráveis a que se apurem as causas das mortes ocorridas numa instituição que já conta com um número considerável de casos, todos eles muito mal explicados e sem que nunca tenham existido ou sido conhecidas quaisquer consequências visíveis – demissões, exoneração de cargos, ou castigos a nível das chefias militares. As únicas consequências que conheço são as promoções e mais promoções. Em termos de promoções, Portugal tem mais generais que o Corpo do Exército Americano. O embaixador Americano Thomas Stephenson topou o filme, e fez o seguinte relatório enviado a 5 de março de 2009 para Washington com o título: 

"O que há de errado com o Ministério da Defesa português?"

“O documento inclui um diagnóstico desassombrado sobre uma estrutura "rígida" e incapaz de tomar decisões. "A imagem de generais sentados sem fazerem nada não é uma mera alegoria".
"Os militares têm uma cultura de statu quo em que as posições-chave são preenchidas por carreiristas que evitam entrar em controvérsias, em vez de serem preenchidas com pensadores criativos, promovidos pelo seu desempenho", escreve o embaixador americano.
"Espera o tempo suficiente, dizem-nos os oficiais, e chegarás a coronel ou a general. Esta cultura fomenta um pensamento adverso a correr riscos e um corpo de oficiais superiores para quem adiar uma decisão é quase sempre a melhor decisão". Stephenson explica o que quer dizer com um caso: "Pedimos ao comandante da academia militar portuguesa se a banda da academia podia atuar numa receção da embaixada americana. O general de duas estrelas respondeu que isso teria de ser aprovado pelo chefe do Estado-Maior do Exército".
"Como a maioria dos aliados da NATO, Portugal encontra-se abaixo do padrão oficial que determina dois por cento do PIB para o orçamento de defesa. Portugal está nos 1,3 por cento e gasta esse dinheiro de forma imprudente. Portugal tem mais generais e almirantes por soldado do que quase todas as outras forças armadas modernas: 1 para cada 260 soldados. Em comparação, os Estados Unidos têm um rácio de 1 para cada 871 soldados". Mais: existem ainda "170 generais adicionais que recebem o ordenado por inteiro enquanto se mantêm inativos na reserva".
"Um corolário da regra de que ninguém toma decisões de comando", continua o embaixador, "é que qualquer pessoa pode bloqueá-las. Ultrapassar estes obstáculos exigiria que um oficial viesse a público desafiar a oposição interna, num ato raramente valorizado".
O cenário de bloqueio interno é agravado pela segregação que existe entre os três ramos das forças armadas e o Estado-Maior-General. O telegrama refere-se aos ramos (exército, marinha e força aérea) como "feudos". "O chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas não tem orçamento nem autoridade sobre os chefes dos ramos, que regularmente ignoram as ordens dele".

Retomando o assunto dos Comandos: A RTP visitou a história das últimas três décadas dos Comandos e o resultado deixa muito a desejar. Qualquer militar que tombe em combate é por si só um facto dramático, mas muito mais dramático é quando um militar tomba na instrução dos extra terrestres, para alimentar o ego dos chefes militares. Não venham p’ra cá dizer que a culpa é do Médico ou do Primeiro-sargento. A culpa é das chefias militares, começando pelo CEME. Parece haver um esquema de super homens, baseado em abusos e desvios no rigor, no respeito pela vida dos instruendos, dos militares e dos cidadãos. Convém analisar e saber se é razoável que uma organização que tem vindo a sacrificar jovens, empregando métodos que prejudicam a sua saúde física e que os levam até à falência será razoável. 
Esta é, na minha opinião, a verdade que interessa apurar, a verdade que deve ser lembrada aos chefes militares e carregadores de chapas e medalhas (por terem apenas comandado uma unidade ou até o bar de praças, ou por terem ido à Bósnia, em tempo de paz, ganhar dinheiro). Para além dos efeitos objectivos, cabe assinalar os resultados das autópsias das mortes anteriores de que as famílias nunca tiveram conhecimento. A perda de confiança começa a ser inevitável e é indispensável inverter esta tendência negativa, que ameaça  derrubar mais militares durante a instrução. É grave, quando se tem que alertar uma instituição que um dos princípios fundamentais da nossa Constituição é garantir o direito à vida! 

Há pouco tempo, no passeio marítimo de Oeiras, encontrei um Coronel Paraquedista do meu tempo e fizemos uma caminhada. Entre outros assuntos, perguntei-lhe:
- Então Sr. Coronel, como explica que o fulano, o sicrano e o beltrano tenham subido a generais e que os outros oficiais superiores, entre os quais também se inclui, tenham sido ultrapassados?
 - Para se ser general é preciso ter amigos certos, estar no local certo, na hora certa, ou na festa certa. Mas então não sabia que General é um posto de confiança do poder político? – respondeu.
Hoje dou comigo a pensar: Que raio, essa é boa! Quando são promovidos, beijam as mãos dos políticos e quando são chamados à responsabilidade pelos políticos, ai Jesus, que isso não pode ser?

Afinal, em que ficamos?

Adérito Barbosa in olhosemlente

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